Vol. 7 Núm. 2 (2022): Dossiê "Os conflitos ambientais nas lógicas das alteridades"
Os chamados conflitos socioambientais são um importante objeto de estudo para o pensamento crítico e a ação social latinoamericanos. De modo geral, e apesar de seus distintos matizes, os esforços de esquadrinhamento desses conflitos partem de uma linguagem analítica determinada por tradições euroamericanas. Ainda que sem discordar dessas análises, existem elementos sobre os conflitos socioambientais que excedem a tradição acadêmica e sua forma de produzir e analisar conceitos. Assim, interessa deslocar parcialmente o olhar analítico da matriz euroamericana para pensar sobre os conceitos e as ênfases reflexivas a partir das quais as organizações, pessoas e povos tradicionais (indígenas, afroamericanos e camponeses, entre outros) pensam e atuam nesses contextos.
Evocamos a memória de Berta Cárceres, coordenadora do Conselho Cívico de Organizações Populares e Indígenas de Honduras, assassinada por liderar a oposição à construção do projeto hidroelétrico de Agua Zarca. Falando sobre o tema, Berta dizia saber, desde sempre, as dificuldades da luta, mas também sabia que venceriam, "o rio me disse", ela contava. Como entender o conflito da perspectiva daqueles que, como Berta, escutam o rio? A própria noção daquilo que faz um rio, ao menos a partir de certa perspectiva moderna, se vê transformada.
O esforço deste dossiê consiste em repercutir reflexões e mediações outras para conceitos como extrativismo, desenvolvimento, terra, território e conflito. Multiplicar e complexificar o que se entende por conflitos, seus contornos, e as formas particulares de composição de mundos - mundos que se organizam para evitar a sua destruição ou que se recriam em meio à ruínas.