O PRINCÍPIO DA FUNÇÃO SOCIAL NO ESTATUTO DA TERRA E O PROCESSO DE DESAPROPRIAÇÃO DA FAZENDA ANNONI, NO NORTE SUL RIO-GRANDENSE
Abstract
Interpretado muitas vezes como uma ameaça à determinada concepção de propriedade cristalizada e defendida pelos latifundiários, o princípio da função social preconiza que o uso da terra não deve contrariar o interesse da coletividade. O princípio legal em si possibilitaria a realização da reforma agrária no país, democratizando o acesso à terra, tornando possível corrigir distorções históricas no acesso à terra. No entanto, mesmo estabelecida em lei (Estatuto da Terra), a possibilidade de desapropriar terras para condicioná-la a uma função social, acaba encontrando empecilhos a sua concretização. Tais constatações baseiam-se em dados empíricos, e foram feitas a partir da análise do processo de desapropriação da Fazenda Annoni, grande latifúndio situado na região norte do Rio Grande do Sul. A partir da década de 1970 a Fazenda Annoni foi alvo de uma grande disputa judicial entre a família proprietária e a União, que levou décadas até ser resolvida. Nele, a função social foi usada pela União como pretexto para a desapropriação, enquanto a família desapropriada apegava-se ao direito a propriedade. Nesse sentido, o presente artigo objetiva discutir a legislação agrária da época, que torna possível a desapropriação, contextualizando o surgimento do princípio da função social e a elaboração do Estatuto da Terra, apontando para algumas contradições e ambiguidades na lei, que possibilitaram que o processo de desapropriação adquirisse enorme complexidade.