CRÔNICA: A PONTE DA BOLÍVIA.
Resumo
A PONTE DA BOLÍVIA
Escrever é pura bruxaria, olha eu acordando de madrugada para escrever esta suposta crônica, transpondo a barreira da mente para a escrita, um bichinho me cutucou e acordei quase rindo.
Quem mora em casas antigas com histórias de vidas dramáticas tem com certeza algo para falar sobre assombrações, coisas do tipo que povoam nossa imaginação. Sobre isso, tenho uma vasta experiência advinda da casa em que passei a infância e, mais tarde, a casa da infância das minhas filhas.
A casa ficou para trás, moramos em um apartamento sem histórias, circulamos rapidamente por escadas de um prédio de 4 andares, onde as vidas acontecem fora dos corredores. Por esses corredores apenas breves burburinhos de crianças, chinelos, pessoas se despedindo às portas, nada demais.
Numa tarde de sábado tranquila, minha filha escuta alguém chorando no corredor, o nosso yorkshire vai até à porta e se põe a ouvir intrigado também, imaginando ser minha outra filha retornando do trabalho aos prantos. A caçula abre a porta em desespero e, para surpresa dela e do cachorro, não havia ninguém lá, imaginou?!...
Ao contar-nos da façanha do espectro chorão, disse-lhe de um suposto cemitério de índios, no lugar em que esses prédios foram construídos, e caímos na gargalhada. Talvez fosse até verdade, fiquei imaginando como era a vida antes de surgirem esses empreendimentos imobiliários próximo à Barreira Policial da BR 174.
Há poucos metros dali, algo me aguça a memória, a Ponte da Bolívia, a principal ponte por onde correm os igarapés da bacia do Tarumã-açu.
Muita água rolou por debaixo dessas pontes, temos tanta água cruzando as esquinas dos prédios onde moramos sob pontes que hoje, anônimas, abrigam ruas de acesso aos condomínios.
A Ponte sobre o igarapé da Bolívia tinha história, esse era um famoso balneário dentre todos que existiam na década de 70 em Manaus, também sinistro, muita gente ao mergulhar da ponte, talvez alcoolizada, quebrava o pescoço, isso minha mãe dizia a nos meter medo dos perigos do balneário, suponho ter sido a maneira de nos desestimular ao pretenso lazer economicamente inviável.
Será então que esses espectros banhistas vagam pelos igarapés poluídos do derredor dos prédios. Se esse é o motivo do choro no corredor, eu diria que o choro vem do igarapé turvo, triste e medonho que hoje corre na escuridão de uma mata fechada onde antes haviam beiras de rios cristalinos e gelados, repletos de famílias inteiras se divertindo, onde eu nunca fui.