SUICÍDIO E VALOR DA VIDA EM MONTAIGNE
Resumo
O artigo apresenta e discute a visão de Montaigne sobre o suicídio a partir do capítulo 3 do livro II do Ensaios, intitulado “Costume da ilha de Céos”. Nesse capítulo, encontram-se argumentos favoráveis e contrários à morte voluntária. Em seus contornos gerais, os argumentos a favor do suicídio repousam em teses de índole estoica. As teses contrárias ao autoaniquilamento baseiam-se em alegações sobre o pertencimento do indivíduo a uma autoridade transcendente ou política. Montaigne também pondera as dificuldades que a decisão pelo suicido deve enfrentar tendo em vista a incerteza sobre o futuro. Em que pese o capítulo representar uma exposição aparentemente neutra dessas posições rivais, as últimas palavras de Montaigne indicam seu posicionamento pessoal, a saber, um reconhecimento de que uma dor insuportável e uma morte pior são motivos escusáveis para o suicídio. O artigo tenta defender a tese de que há um comprometimento filosófico maior de Montaigne a favor do suicídio do que se poderia supor ao se levar em conta apenas a superfície expositiva de seu texto. Defende-se, ainda, que a discussão sobre o suicídio em Montaigne nos ensina que podemos encarar filosoficamente esse tema sem que precisemos de uma compreensão metafisica específica sobre o valor da vida.
Palavras-chave: suicídio, direito, ética, valor da vida.
Abstarct
The article explores Montaigne’s view on suicide as presented in Chapter 3 of Book II of Essays, “Custom of the Isle of Cea”. The chapter presents arguments both for and against suicide. In its general outline, the pro-suicide arguments are based on Stoic principles, while the arguments against are based on the idea that the individual belongs to a transcendent or political authority. Montaigne also discusses the inherent difficulties in the decision to commit suicide, given the uncertainty of the future. Although the chapter appears to present a neutral view, Montaigne’s final words indicate his personal stance: he acknowledges that unbearable pain and a worse death are justifiable reasons for suicide. The article argues that Montaigne has a stronger philosophical commitment to suicide than is apparent on the surface of his text. Furthermore, it argues that Montaigne’s discussion on suicide shows us that we can philosophically approach this issue without the need for a specific metaphysical understanding of the value of life.
Key words: suicide, right, ethics, value of life.