ENSINO
DE LÍNGUA PORTUGUESA PARA DEFICIENTES VISUAIS: ANÁLISE BIBLIOGRÁFICA DO PERÍODO
DE 2005 A 2017
PORTUGUESE
LANGUAGE TEACHING FOR VISUAL DISABILITIES: BIBLIOGRAPHIC ANALYSIS OF THE PERIOD
2005 TO 2017
Bruna de Oliveira CAMANDAROBA[1] | Patrícia OLIVEIRA[2]
RESUMO: O ensino de Língua Portuguesa para alunos
deficientes visuais pode ser compreendido como um grande desafio aos
professores da área em razão das necessidades específicas destes alunos. A
presente pesquisa, de caráter exploratório, teve por objetivo conhecer o campo
de estudos e pesquisas sobre o ensino de Língua Portuguesa para este público
específico de alunos. Desta forma, foi desenvolvida uma pesquisa bibliográfica
de teses e dissertações desenvolvidas sobre este tema. Após o levantamento dos
dados na página da BDTD, foram identificadas cinco pesquisas sobre o tema.
Estas apontaram que o atendimento educacional e o ensino de Língua Portuguesa
para alunos deficientes visuais têm enfrentado significativos problemas, como a
falta de preparação dos professores, a ausência de recursos, falta de diálogo
entre o professor do AEE e o professor da sala comum, entre outros. Concluímos
que a formação inicial e continuada dos professores pode contribuir
significativamente para a melhoria destas condições, pois este profissional
exerce papel imprescindível na validação dos recursos e materiais para o
processo de ensino e aprendizagem, para o desenvolvimento da subjetividade dos
alunos, e para a sensibilização necessária à inclusão escolar e social.
Palavras-Chave: Deficiência Visual. Ensino de Língua Portuguesa. Escola.
ABSTRACT: The teaching of Portuguese language for visually impaired students may be understood as a great challenge to the teachers of this field because of the specific needs of these students. This exploratory research aimed to know the field of studies and research about teaching of Portuguese Language for this specific audience. In this way, a bibliographical research of thesis and dissertations were developed regarding this topic. After the data were collected on the BDTD page, five researches on this issue were found. They pointed out that educational services and Portuguese language teaching for visually impaired students have faced noteworthy difficult situations, such as lack of teacher preparation, lack of resources, lack of dialogue from the Special Educational Teacher with regular teachers, among other problems. We have concluded that the initial and continuous training of teachers may contribute significantly to the improvement of these conditions, since this professional performs an essential role in the resources and materials validation in the teaching and learning process, focusing on the development of students' subjectivity and helping to increase the willingness of the students to contribute to educational and social inclusion of the impaired individuals.
Keywords: Visual impairment. Teaching Portuguese Language. School.
Recebido em: 27/04/2018
Reformulado em: 31/08/2018
Aceito em: 09/01/2019
INTRODUÇÃO
O
ensino de Língua Portuguesa para alunos com deficiência visual pode ser
compreendido como um significativo desafio a ser enfrentado não apenas pelo
profissional desta disciplina específica, mas por toda a equipe escolar. De
acordo com Sá, Campos e Silva (2007, p. 21),
Para que o aprendizado seja completo e
significativo é importante possibilitar a coleta de informação por meio dos
sentidos remanescentes. A audição, o tato, o paladar e o olfato são importantes
canais ou porta de entrada de dados e informações que serão levados ao cérebro.
Lembramos que se torna necessário criar um ambiente que privilegia a
convivência e a interação com diversos meios de acesso à leitura, à escrita e
aos conteúdos escolares em geral.
Em outras palavras, significa
que toda a unidade escolar deve se adaptar e se organizar para que possa
oferecer as condições adequadas e necessárias ao processo de educação escolar
destes alunos. Também significa que se faz urgente a adequação das aulas de
Língua Portuguesa para que possam acessar a norma culta da linguagem escrita,
seus usos e funções sociais.
O ensino de Língua Portuguesa em
nosso país tem sido pautado pelos Parâmetros Curriculares Nacionais - PCNs
(BRASIL, 1997; 1998) desde o final da década de 1990. Segundo esses documentos,
os objetivos para o primeiro (1º ao 5º ano) e segundo (6º ao 9º ano) ciclos
podem ser compreendidos da seguinte maneira: expandir os usos das linguagens
oral e escrita, empregando-as corretamente nos contextos vivenciados;
apropriar-se dos diferentes registros escritos e saber utilizá-los nas variadas
situações sociais; “conhecer e respeitar as diferentes variedades linguísticas
do português falado [...]” (BRASIL, 1997, p. 33), compreender e fazer uso dos
diferentes gêneros textuais; “valorizar a leitura como fonte de informação [...]”
(BRASIL, 1997, p. 33); compreender e fazer uso da linguagem como fonte e
instrumento para a aprendizagem; utilizar a linguagem de forma apropriada em
suas relações pessoais; usar os conhecimentos da linguagem para desenvolver
capacidade de análise crítica; e compreender que a linguagem é veículo de
valores e preconceitos, assumindo uma postura crítica diante dos fatos
discriminatórios.
O Plano Nacional de Educação
Decênio 2014-2024, promulgado pela Lei nº 13.005 de 25 de junho de 2014
(BRASIL, 2014), previu em sua meta 4 – Educação Especial – as seguintes
condições para o atendimento educacional dos alunos com deficiência visual: a
garantia de Atendimento Educacional Especializado (AEE) de forma a complementar
ou suplementar o trabalho pedagógico desenvolvido pela sala de aula comum; a
estimulação de centros de apoio, pesquisa e assessoria integrando profissionais
de diferentes áreas do conhecimento de forma a promover uma rede de
atendimento; promover programas que viabilizem o acesso e a permanência na escola
por meio da adequação da arquitetura do transporte, de material didático
adaptado, e da oferta de tecnologia assistiva; e a adoção do sistema Braille
para cegos e surdocegos.
A atual Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional – LDB nº 9.394 de 20 de dezembro de 1996 (BRASIL,
1996) afirmou que os sistemas de ensino devem assegurar currículos, métodos,
técnicas e a organização necessários ao atendimento educacional dos alunos com
deficiência, assim como prover a presença de professores especialistas e
especializados tanto para o atendimento na sala de recursos multifuncionais
quanto na sala de aula comum.
Portanto, diretrizes e
orientações a respeito do que precisa ser realizado para o atendimento educacional
dos alunos com deficiência visual já se encontram descritas e apontadas por
meio do conjunto de publicações do Ministério da Educação (MEC), e em especial
pelas publicações da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização,
Diversidade e Inclusão (SECADI). O que nos resta é concretizar estas propostas
de ações no fazer pedagógico dentro da sala de aula.
No entanto, o fazer pedagógico
do professor da sala de aula comum ainda é marcado por atitudes e posturas que,
mesmo que não sejam intencionais, implicam de forma negativa sobre o
aprendizado dos alunos com deficiência visual, indicando desconhecimento em
relação às suas necessidades e falta de (in) formação.
Frente à presença de um aluno
com deficiência visual na sala comum, muitos professores enfrentam dúvidas,
dificuldades e problemáticas que podem ser expressas em questionamentos como:
Como ensinar as especificidades da linguagem escrita a um aluno que não vê?
Como fazer com que ele aprenda? Como fazer com que ele se sinta acolhido? Que
recursos utilizar? Como proceder? Como garantir sua aprendizagem e autonomia?
Desta forma, aprofundar os
estudos e pesquisas relativos ao ensino de Língua Portuguesa para os alunos com
deficiência visual se mostra como um processo necessário e contínuo para que
possamos compreender os mecanismos que cerceiam a aprendizagem escolar destes
alunos. Além disso, o aprofundamento nos estudos e pesquisas pode favorecer a
compreensão da subjetividade destes sujeitos, atendendo suas expectativas em
relação à própria formação.
Portanto,este estudo consistiu
em analisar as teses e dissertações desenvolvidas sobre o tema “Ensino de
Língua Portuguesa para Deficientes Visuais” e defendidas no período de 2005 a
2017, com a finalidade de conhecer quais os conhecimentos já construídos sobre
esta questão.
MÉTODO
Para
a realização desta pesquisa foi utilizada a análise bibliográfica. De acordo
com Therrien e Therrien (2004), a finalidade deste modelo de pesquisa é
compreender o “estado da questão” sobre um determinado tema de estudo,
apontando quais os conhecimentos já construídos e quais as lacunas ainda
existentes.
Para
a coleta de dados, foram analisadas teses e dissertações que tiveram como
objeto de estudo o ensino de Língua Portuguesa para deficientes visuais. As teses
e dissertações foram buscadas na Biblioteca Digital de Teses e Dissertações
(BDTD). As palavras-chave utilizadas foram: Língua Portuguesa para cegos,
Educação de cegos e Língua Portuguesa para deficientes visuais.
O
período escolhido foi de 2005 a 2017 em razão da promulgação de importantes políticas
públicas voltadas para a inclusão escolar e social de pessoas com deficiência.
Para ser incluída neste estudo, a pesquisa deveria ter sido defendida dentro do
período escolhido e abordar aspectos do ensino de Língua Portuguesa para
deficientes visuais.
Para
a análise dos trabalhos foram utilizadas as fichas de análise de Teses e
Dissertações proposta por Mendes, Ferreira e Nunes (2003). O levantamento
inicial apontou para 200 pesquisas que, após a aplicação dos critérios de
inclusão e exclusão, resultou em 05 trabalhos que abordaram especificamente o
ensino de Língua Portuguesa e sua normativa para alunos com deficiência visual.
RESULTADOS E
DISCUSSÕES
Após
a limpeza dos dados, as pesquisas a serem analisadas que correspondiam ao
objetivo deste estudo estão descritas na tabela a seguir:
Tabela 1: Pesquisas selecionadas
para a análise |
||||
Autor |
IES |
Título |
Nível M: mestrado D: doutorado |
Ano |
Vivian de Oliveira Preto |
UNESP |
Adaptação de
livros de literatura infantil para alunos com deficiência visual |
M |
2009 |
Maria Cláudia A. Santana Regis |
USP |
Categorias
literárias, programas de áudio para o incentivo de deficientes visuais: um
olhar transdisciplinar |
D |
2009 |
Amanda Botelho Corbacho Martinez |
UFBA |
Ensino de
ortografia e Sistema Braille: um estudo de caso. |
M |
2011 |
Daiana Zanelato dos Anjos |
UFSC |
Da tinta ao
Braille: estudo de diferenças semióticas e didáticas dessa transformação no
âmbito do Codigo Matemático Unificado para a Língua Portuguesa – CMU e do
Livro Didático em Braille. |
M |
2015 |
Marleide dos Santos Cunha |
UFSE |
Ensino da Língua
Portuguesa na perspectiva da inclusão do aluno cego no nível fundamental |
M |
2015 |
Fonte: As autoras.
Por
meio da tabela acima é possível observar a baixa presença de teses e
dissertações sobre o tema. As palavras-chave e os termos de busca utilizados
para o levantamento dos dados podem ter contribuído para este resultado. O
baixo uso dos termos Língua Portuguesa para cegos, Educação de cegos e Língua
Portuguesa para deficientes visuais pode apontar que as pesquisas sobre ensino
desta disciplina podem estar sendo subdivididas em estudos sobre aspectos muito
específicos, como alfabetização, ortografia, morfologia, gramática, entre
outros, o que pode dificultar a compreensão global do processo. Ou, ainda,
significar a concentração dos estudos em questões do desenvolvimento de
tecnologias assistivas ou mobilidade e orientação.
Em
relação ao nível das pesquisas encontradas, podemos observar um número maior de
dissertações em relação ao número de teses. Esta diferença sempre pode ser
esperada em razão da maneira como os programas de pós-graduação são
distribuídos pelo país[3].
E
em relação à análise das pesquisas encontradas, devido ao número bastante baixo
de trabalhos encontrados, iremos analisar e discutir os objetivos e os achados
científicos destas com a finalidade de atender à nossa proposta de estudo.
VIVIAN DE
OLIVEIRA PRETO: ADAPTAÇÃO DE LIVROS DE LITERATURA INFANTIL PARA ALUNOS COM
DEFICIÊNCIA VISUAL
Preto
(2009) teve por objetivo adaptar livros de literatura infantil para crianças
cegas da Educação Infantil. De acordo com esta pesquisadora, da mesma maneira
que a literatura infantil é importante para o desenvolvimento das crianças
videntes, ela também o é para as crianças cegas. No entanto, a criança cega não
pode usufruir da manipulação dos livros da mesma maneira; ela vai fazer uso de
outros sentidos. Para isso, as professoras podem fazer uso de diferentes
recursos que colaborem no desenvolvimento dos conceitos pela criança cega.
Citando
Campos (1990 apud PRETO, 2009), a
pesquisadora afirmou que ser cego não impede o sujeito de adquirir a escrita. O
problema está na falta de materiais transcritos para o Braille, o que acaba
limitando seu acesso a cultura escrita e ao desenvolvimento pleno das normas
desta modalidade de linguagem.
Preto
(2009) também pontuou a importância da adaptação dos materiais para que as
crianças cegas possam participar das atividades escolares em situação de
equidade com as outras crianças e em atendimento à legislação educacional
vigente.
Sobre
este processo de adaptação, a pesquisadora avaliou a atuação das professoras e
constatou que estas faziam dois tipos de adaptação: a adaptação tátil e a
adaptação de vocabulário. Entretanto, muitas vezes as professoras acabavam se
esquecendo da maneira adequada de atuar junto à criança cega, conforme a
descrição da pesquisadora:
[...] P1:
...e apareceu uma outra família de animais aqui (( aponta para a ilustração do
livro)) alguém lembra do nome que eu falei’
C1: Não
C2: canguru’
P1: Não é
canguru..olhem aqui ((aponta para a figura)) é uma família de pacas [...]
No exemplo acima
citado, a professora já sabia que seus alunos não conheciam a palavra “paca” e
o que ela significava, então em uma primeira etapa, ela contou todo o livro, e,
depois, repassou a história mostrando para as crianças as figuras,
incentivando-as a contar com suas próprias palavras. Quando se chegou à página
onde as pacas estavam, ela lhes mostrou o animal a que a palavra se referia
para que as crianças soubessem o que era.
Nesse contexto, as crianças souberam o que paca
significava, que tipo de bicho era, onde o bicho vivia e do que se alimentava,
estando essas informações na ilustração do livro. O aluno deficiente visual não
enxergou a figura e teve como apoio a explicação verbal. Nessa situação, teria
sido ideal que o aluno tivesse uma figura adaptada, assim como os alunos
videntes tinham a ilustração em tinta. (PRETO, 2009, p. 63).
Este
esquecimento da presença do aluno com deficiência visual nas salas de aula
comuns é um relato constante. De acordo com Lippe, Alves e Camargo (2011) e
Vilaronga e Caiado (2013), é muito comum as professoras se esquecerem da
presença do aluno com deficiência visual na sala de aula, e que este aluno pode
apresentar a mesma dúvida que os demais. Assim, no momento em que repetem a
explicação ou fazem uso de outros exemplos para efetivar a compreensão do
conteúdo, acabam utilizando recursos voltados apenas para os alunos videntes.
Este
esquecimento pode estar relacionado com a falta de preparo dos professores para
atuar junto a este público-alvo e também com o fato de que a inclusão escolar
dos sujeitos com deficiência ainda se encontra em desenvolvimento nas escolas
brasileiras.
Preto
(2009) também apontou situações nas quais as professoras procuravam uma forma
de favorecer a aquisição do conceito pela criança cega por meio daquilo que
tinha disponível.
A9: Qual é a
cigarra e qual é a formiga’
((a professora olha
o livro, mostra a figura apontando para o aluno))
P4: é essa
aqui...alguém aqui já viu uma cigarra? ((alguns alunos levantam a mão e
respondem))
[...] A8,A4,A5,A6:
Eu já’
P3: E você C8’ já
viu’
C3: Eu já’ (+) não
((a professora vai à direção dela))
P4: você não viu (+)
deixa eu pensar, haaa já sei ( se direciona para o aluno C7) vai lá na sala da
professora e pede para ela aquela cigarra que ela tem, (se direciona paraC3) a
cigarra é aquele bichinho que canta, canta, canta...
A7: ela pula também’
P4: pula e canta, huiiiiii
((as crianças dão risada)) e falam que ela canta até estourar(+) mas não é que
ela estoura ela sai da casa e deixa a casca na árvore [...]
De acordo com a transcrição da filmagem, a maioria
das crianças na sala não sabia o que era uma cigarra e precisaram de uma
explicação verbal e visual para entender o que era.A criança cega, além da
explicação verbal dada a todos os alunos, precisava tatear o objeto para formar
uma imagem mental. A professora tentou pegar um exemplar na sala de ciências,
porém não o encontrou, e, por isso, deu-lhe uma formiga, inseto que a criança
também não conhecia. (PRETO, 2009, p. 65)
O
exemplo acima citado por Preto (2009) nos informa a complexidade e a quantidade
de recursos necessários para o processo de aprendizagem do deficiente visual.
No caso citado, apenas a leitura da narrativa não faria sentido se a criança
não soubesse de quem se tratavam as personagens. Diante destes aspectos, cabe
reforçar a importância do planejamento e organização do ensino para que os
conteúdos sejam devidamente adaptados e os materiais e recursos assistivos
necessários sejam providenciados pelo professor da sala de aula comum.
Preto
(2009) também descreveu detalhadamente o processo de adaptação de alguns livros
infantis para o manuseio das crianças cegas e, em suas considerações finais,
abordou a importância do preparo dos professores e dos familiares para o
processo de introdução da criança cega no mundo da leitura, com a finalidade de
buscar a melhor maneira de favorecer o desenvolvimento dos conceitos por estas
crianças. Em relação à adaptação dos materiais, a pesquisadora fez pontuações
importantes sobre o processo e a escolha do material, indicando a maneira como
estes detalhes contribuem e influenciam a forma como as crianças cegas irão
lidar com a leitura e a escrita.
Recomenda-se, assim, que os profissionais gráficos
voltem sua atenção para um mercado que possui demanda. Falta material para
muitas pessoas, que estão dispostas a aprender ou a contratar serviços
especializados para a produção de livros, imagens e fascículos, convites
adaptados para as necessidades de seus filhos e alunos. (PRETO, 2009, p. 121).
Com
base no exposto podemos inferir que a ausência de materiais adaptados para a
educação escolar do aluno com deficiência visual pode se constituir em um
considerável obstáculo para o trabalho pedagógico na sala comum, principalmente
se considerarmos que quando este material é adquirido pelos sistemas de ensino,
eles são destinados às salas de recursos, raramente chegando às salas comuns.
Desta
forma, a qualidade na educação dos alunos com deficiência visual exige
financiamento e pesquisa para o desenvolvimento e a aquisição dos recursos
necessários ao seu atendimento educacional tanto na sala de recursos quanto na
sala comum, assim como na formação de professores para atuar junto a este
público.
MARIA CLÁUDIA
A. S. REGIS: CATEGORIAS LITERÁRIAS, PROGRAMAS DE ÁUDIO PARA O INCENTIVO DE
DEFICIENTES VISUAIS: UM OLHAR TRANSDISCIPLINAR
Regis
(2009) analisou o desenvolvimento de um programa para educação de cegos
denominado Categorias Literárias. Este programa nasceu da parceria da Fundação
Dorina Nowill e a Biblioteca Virtual da USP – BibVirt– com a finalidade de incentivar o gosto pela leitura por
meio da disponibilização da literatura brasileira e portuguesa.
A proposta
desse projeto era inserir a pessoa com deficiência visual no mundo da leitura e
literatura brasileira e portuguesa, com o intuito de contribuir para que este
segmento não ficasse à margem da leitura e literatura.
Durante a concepção do projeto, estive envolvida na
produção dos programas de áudio, como pesquisadora e como convidada. Em
ocasiões específicas fui entrevistada para discorrer sobre o tema educação
especial. Colaborei nas gravações dos programas narrando os personagens para
algumas das séries: Clássicos da literatura brasileira e portuguesa, Descoberta
do conto e Contos populares; episódio que enriqueceu a escrita desse
trabalho. (REGIS, 2009, p. 35).
De acordo com Regis (2009),
todos os programas foram concebidos com o intuito de promover satisfação pela
leitura e, ao mesmo tempo, favorecer o contato com importantes obras da
literatura. A pesquisadora também trouxe um detalhado relato de todo o processo
de constituição do programa, da maneira como as obras foram selecionadas, e das
gravações em formato de áudio-aula.
Embora o trabalho de Regis
(2009) não trate diretamente do ensino de Língua Portuguesa para deficientes
visuais, ele nos traz um detalhado relato do desenvolvimento de materiais para
o ensino de Literatura, um dos conteúdos da disciplina que exige altos níveis
de abstração e favorece do desenvolvimento do letramento. Portanto, o
desenvolvimento de mais programas como o Categorias Literárias proposto por
Regis (2009) pode se transformar em instrumentos importantes para a
aprendizagem da Língua Portuguesa para alunos deficientes visuais.
AMANDA BOTELHO
CORBACHO MARTINEZ: ENSINO DE ORTOGRAFIA E SISTEMA BRAILLE: UM ESTUDO DE CASO.
Martinez
(2011) teve por objetivo analisar a maneira como um professor ensinava
ortografia para os alunos cegos em uma sala de aula comum. Para isso, a
pesquisadora desenvolveu um estudo de caso.Sobre o ensino de Língua Portuguesa
e a relação de seus usuários, a pesquisadora afirmou que:
[...] o ensino da língua na perspectiva da
linguagem como forma de interação humana lança-nos para o estudo da linguagem
em funcionamento. Essa nova perspectiva obriga a um novo posicionamento acerca
das variedades linguísticas (regionais ousociais) enfrentadas pelo professor no
cotidiano da sala de aula. É frequente o questionamento dos educadores quanto à
melhor forma de agir no ensino diante das diferenças dialetais. (MARTINEZ,
2011, p. 28).
Sobre o ensino de ortografia
especificamente, Martinez (2011, p. 45) afirmou que “[...] o ensino da
ortografia deve ser organizado de forma sistemática”, pois se faz necessário
que metas sejam definidas para que os alunos do Ensino Fundamental adquiram os conhecimentos
ortográficos exigidos pelo código escrito.Em sua análise dos dados, a
pesquisadora apontou diversas dificuldades enfrentadas pelos professores da
sala de aula comum. De acordo com o relato da pesquisadora,
Numa aula
sobre acentuação era necessária a explicação acerca das representações do
acento na escrita convencional e na escrita em braille, uma vez que nesse
sistema de escrita cada vogal acentuada possui uma combinação de pontos
diferenciada em relação à vogal não acentuada, enquanto que na escrita
convencional são usados sempre os mesmos sinais para representar os acentos (^,´,`).
Em braille, a letra a, por exemplo, é representada pelo ponto 1; á
é representada pelos pontos 1,2,3,5,6; â é representada pelos
pontos 1,6. Ainda que não soubesse escrever pelo sistema em relevo, a
professora poderia ter utilizado a tabela com os sinais das letras em braille
(entregue pela instituição especializada para ela, no início do ano letivo)
para esclarecer essas diferenças. Explicações dessa natureza tornam-se
interessantes, inclusive, para os alunos videntes.[...]
Além disso, se Rosa tivesse informado os pontos
usados para representar cada letra acentuada, a aluna poderia ter feito o
exercício, já que não tinha dificuldades para usar reglete, apenas não conhecia
as combinações de pontos para cada vogal acentuada em braille. Para enriquecer
a aula, a professora também poderia ter mostrado para a aluna cega a
representação dos acentos agudo e circunflexo, “em tinta”. Para isso, poderia
utilizar tinta relevo. (MARTINEZ, 2011, p. 115).
A citação, embora longa, nos
traz importantes apontamentos sobre as necessidades dos alunos cegos durante a
aula. Muitas vezes, os professores se esquecem de detalhes preciosos para que o
aluno que não vê possa compreender as normas e as convenções da escrita. Portanto,
o atendimento dos alunos com deficiência visual e/ ou cegueira requer dos
professores atenção a todos os detalhes, pois só assim estes alunos poderão
acompanhar a aula de forma satisfatória e não perder a sua motivação para
aprender.
Outro fator apontado por
Martinez (2011) é a importância do aprendizado do Braille pelos professores e
pelos familiares das crianças cegas, pois este fato pode favorece as relações
que a criança venha a estabelecer com a linguagem escrita fora dos espaços
escolares e fortalecer seu aprendizado na escola. Neste contexto, a
pesquisadora descreveu a relação entre uma professora de uma sala comum, um
aluno cego, e a professora da sala de recursos.
Novamente, Elisa não ditou para Alan o que havia
copiado no quadro, e o aluno, mais uma vez, não participou da aula. Observamos
que a regente copiou em uma folha de ofício o que registrou no quadro e, quando
a professora da sala de recursos passou na classe de Alan, Elisa pediu que ela
transcrevesse para braille. Quando a atividade em braille chegou, foi entregue
à Alan. Verificamos que não estava completa, pois Elisa diminuiu a quantidade
de questões para o aluno cego. Ainda assim, quando ele recebeu o exercício, já
havia sido corrigido pela professora. As correções ocorreram com pouca reflexão
sobre a escrita das palavras. As regras de ortografia (que foram ditadas pela
professora e não construídas pelos alunos, já no início da atividade a
professora escreveu a regra para o uso de m antes de p e b),
eram repetidas sempre que os alunos erravam na escolha entre m ou n;
s ou ss. (MARTINEZ, 2011, p. 128).
Como podemos observar, os alunos
com deficiência visual podem ser excluídos das aulas mesmo estando presente nas
salas, pois os professores não se dirigem a eles e não demonstram preocupação
com sua participação. Assim, a qualidade das mediações necessárias para o
aprendizado fica prejudicada, não permitindo a aquisição do código de escrita.
Martinez (2011) também descreveu
diversas situações nas quais as professoras distribuíam atividades aos alunos
sem algum tipo de intervenção ou reflexão a respeito de seu objetivo ou de sua
função, mostrando que a problemática referente à mediação da aprendizagem não
está apenas no ensino de alunos cegos ou com deficiência intelectual, mas para
todos os alunos.
No entanto, não podemos nos
esquecer que em relação ao aluno com deficiência visual há a necessidade do
apoio complementar ou suplementar de recursos específicos, e que as relações
que se constroem em sala de aula comum podem não atender às suas necessidades.
Martinez (2011) também
entrevistou as professoras dos participantes de sua pesquisa para compreender a
maneira como compreendiam o processo educacional dos alunos cegos e a forma
como procediam na sala de aula. De acordo com a pesquisadora,
Na
entrevista, questionamos as professoras se o fato de o aluno cego estar na
classe regular ocasionou alguma alteração na sua prática pedagógica pra ensinar
conteúdos de ortografia. As professoras afirmaram que
Não, não. Não criou
muito problema não, primeiro porque ela é interessada também, né? E ela já veio
alfabetizada, foi o que me facilitou. Ela já veio alfabetizada, então facilitou
todo o meu trabalho, além dela ser uma criança interessada. Tem dia que ela
está mais preguiçosinha, sem querer fazer, mas ela ajuda. (Rosa, professora de
Sara).
Não. Eu não tenho
uma programação pra Alan. O pessoal da sala de recursos é que vai saber te
responder melhor. Eu realmente não me programo pra Alan. (Elisa, professora de
Alan).
As metodologias são as mesmas e trabalho oralmente.
Com ela eu não trabalho porque eu não entendo realmente, só oralmente.
(Jaciete, professora de Bruna) (MARTINEZ, 2011, p. 138).
Conforme
podemos contatar, as falas destas professoras denotam não apenas despreparo
para atuar junto a estes alunos, mas também indiferença em relação às suas
necessidades e desconhecimento da importância de processos de mediação planejados
para o atendimento educacional do deficiente visual. Desta forma, elas estão
impedindo o acesso destes alunos à cultura escrita e causando sérios atrasos em
seu desenvolvimento escolar, cognitivo e social, podendo trazer sérias
implicações para o seu futuro.
Sobre
os aspectos que implicam sobre o aprendizado da ortografia, Martinez (2011)
apontou para os seguintes problemas: a ausência de adaptação adequada do
material didático, o desconhecimento das professoras sobre o Sistema Braille,
ausência de planejamento de aulas para que o aluno cego possa participar em
equidade, ausência de diálogo com a professora do Atendimento Educacional Especializado,
a necessidade de formação inicial e continuada de professores para atuar com
alunos com deficiência visual, entre outros.
Em
suas considerações finais, Martinez (2011, p. 158) afirmou que
Nas situações de ensino, observamos que nenhuma
mediação (escola estadual) ou poucas e inadequadas mediações (escolas
particular e municipal) foram estabelecidas pelas professoras com seus alunos
cegos, devido ao fato, principalmente, de não lerem pelo Sistema Braille. As
professoras pareciam desconhecer a real importância da aprendizagem da
ortografia para a inclusão social das pessoas com ou sem deficiência e a
relevância do papel do professor como mediador desse processo. Certamente, tal
situação é reflexo da frágil formação inicial e continuada das professoras.
Com base no exposto, podemos
verificar por meio da pesquisa de Martinez (2011) que muitos alunos com
deficiência visual estão sendo excluídos da escolarização porque muitos
professores encontram-se despreparados para atuar junto a esta clientela devido
a uma formação que não prepara os profissionais para os desafios da inclusão
dos alunos com deficiência.Assim, estes continuam sem acesso aos bens culturais
e a uma escolarização de qualidade.
DAIANA ZANELATO
DOS ANJOS: DA TINTA AO BRAILLE: ESTUDO DE DIFERENÇAS SEMIÓTICAS E DIDÁTICAS
DESSA TRANSFORMAÇÃO NO ÂMBITO DO CÓDIGO MATEMÁTICO UNIFICADO PARA A LÍNGUA
PORTUGUESA – CMU E DO LIVRO DIDÁTICO EM BRAILLE.
Embora
a pesquisa de Anjos (2015) esteja voltada para aspectos do ensino de matemática,
concluímos que a inclusão de sua pesquisa neste trabalho possuía significativa
importância devido à preocupação da pesquisadora com o acesso à leitura dos
livros didáticos pelos alunos deficientes visuais.
Anjos
(2015) teve por objetivo analisar o Código Matemático Unificado para a Língua
Portuguesa (CMU) e o Livro Didático transcrito para o Braille (LDB). De acordo
com a pesquisadora, a análise destes documentos devia-se em razão de sua
importância para o ensino dos alunos deficientes visuais e haveria possíveis
incongruências e inconsistências nestes materiais.
Segundo
Anjos (2015) o CMU é uma adaptação do ensino de Matemática para o Sistema
Braille. Seu desenvolvimento histórico é bastante marcado por tensões e
correções. De acordo com Anjos (2015, p. 64), o CMU pode ser compreendido da
seguinte maneira:
Define-se por Código Matemático Unificado para a
Língua Portuguesa, o documento oficial do MEC que oferece ―opções
para arepresentação de símbolos do sistema comum, até agora semrepresentação
adequada no Sistema Braille‖ (BRASIL, 2006a, p. 15).
Éutilizado por transcritores, professores, usuários e pessoas envolvidascom a
educação de estudantes cegos, no intuito de elaborar textos efazer transcrições
de livros didáticos.
Em
relação ao LDB, Anjos (2015)apontou detalhadamente quais os aspectos devem ser
observados para que os alunos cegos possam ter acesso ao conteúdo. Entre estes
aspectos, destacamos os seguintes:
● Os símbolos
matemáticos se escrevem sem celas vazias intermediárias;
● Recomenda-se
disponibilizar tabelas contendo os sinais Braille e seus significados,
especialmente em Matemática e Ciências. Nestes casos, os símbolos também devem
aparecer em relevo, com a forma idêntica ao seu uso em tinta;
● Deve-se
evitar a estenografia, a fim de evitar maiores dificuldades na leitura;
● Os sinais
para os alfabetos latim, grego e gótico alemão devem ser utilizados e possuem
prefixos específicos;
● Em
Matemática, em algumas resoluções, é comum utilizar um traço cortando uma letra
ou expressão para representar um cancelamento. Em outros casos, é comum a
utilização de símbolos para negação. Nestes, para as transcrições, será
utilizado o símbolo 4549 antes do símbolo que necessita ser ―cortado‖ ou negado;
● Para inserir
uma fórmula em um texto literário, deverão ser utilizadas duas celas vazias
antes e depois da fórmula; Para vetores, arcos, ângulos e figuras geométricas
deverão ser utilizados os símbolos do CMU;
● Existem
algumas exceções para essa regra, que devem ser conferidas no CMU (BRASIL,
2006e, p. 57). Nele, essas exceções podem ser verificadas no item 6.3, p. 60.
●O símbolo
para cancelamentos ou negações encontra-se no CMU, p. 44, subtítulo 4.3 -
Relações negativas.
● Deverão ser
utilizados parênteses auxiliares para possibilitar a escrita de
expressões/equações, as quais, devido à forma horizontal da escrita Braille,
não poderiam ser transcritas, como: índices e expoentes, frações, radicandos,
segmentos, ângulos, arcos, etc. O uso dos parênteses auxiliares é ilimitado;
● Na
transcrição de sucessões, progressões e matrizes, os índices inferiores devem
ser abreviados, fazendo uso da quinta série de disposição do Braille. Os
termos, assim abreviados, devem ser separados por celas em branco posicionadas
antes e depois dos mesmos;
●
Expressões/equações que não couberem no fim de uma linha, devem ser escritas na
linha seguinte para evitar incompreensões;
● Para
expressões longas, deve-se separar em linhas diferentes, usando os sinais de
relação (maior, menor, diferente, etc) ou de operação (adição, subtração, etc)
para fazer as separações.
●Esses sinais
utilizados nas separações devem aparecer no fim de uma linha e início de outra;
● Na linha
posterior às separações de expressões longas, deve-se fazer a transcrição em
duas celas antes ou depois da primeira cela da linha anterior;
● Em alguns textos matemáticos, existe a
necessidade de esclarecimento de alguma expressão, sentença ou informação do
texto. Para esclarecer, a transcrição deve apresentar uma nota de transcrição
ou uma explicação entre parênteses. (ANJOS, 2015, p. 73).
Embora
longa, a citação acima nos mostra a importância da viabilização do material de
leitura em qualquer campo do conhecimento, para que os alunos cegos possam ter
acesso a uma aprendizagem efetiva. Em suas considerações finais, Anjos (2015) descreveu
diversas incongruências e inconsistências nos materiais didáticos voltados aos
alunos com deficiência visual. Anjos (2015, p. 132) também ressaltou que
Como pesquisadora e professora de Matemática,
ressalto que o CMU é confuso no que se refere à organização de conteúdos e à
divisão de capítulos, sem contar que a explicação de alguns tópicos nem sempre
é clara e objetiva, muitas vezes, sequer constando no documento. Vale lembrar
também que a sua análise não foi finalizada em relação ao nível de ensino de
todos os conteúdos existentes, já que o foco da pesquisa foi o Ensino
Fundamental, fazendo com que os demais conteúdos referentes ao Ensino Médio e
Superior fossem descartados da análise (ANJOS, 2015, p. 132).
Com base no exposto por Anjos
(2015) podemos constatar que mesmo em situações nas quais o deficiente visual
pode encontrar material adaptado para a sua escolarização, muitas vezes seu
desenvolvimento não procurou pensar em todas as possíveis necessidades,
inviabilizando ou dificultando sua leitura e seu aprendizado.Por meio dos
estudos desta pesquisadora podemos inferir que não basta oferecer materiais
adaptados, é preciso que estes tenham adequação e qualidade.
MARLEIDE DOS
SANTOS CUNHA: ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA NA PERSPECTIVA DA INCLUSÃO DO ALUNO
CEGO NO NÍVEL FUNDAMENTAL.
Cunha
(2015) teve por objetivo analisar o ensino de Língua Portuguesa para alunos
cegos e deficientes intelectuais matriculados em uma sala de alfabetização e em
um 8º ano do Ensino Fundamental. Sobre a alfabetização de alunos cegos e
deficientes visuais, a pesquisadora afirmou que
O processo de alfabetização da criança cega deve
seguir as mesmas estratégias da alfabetização da criança que não tem a
deficiência visual. Porém, devido à presença da deficiência, o cego necessita
de um professor habilitado em Atendimento Educacional Especializado, que crie
possibilidades para facilitar e otimizar esse tempo de alfabetização por meio
de técnicas. (CUNHA, 2015, p. 47).
No caso do aluno que é alfabetizado no Braille
necessita do domínio desse sistema para chegar ao processo de alfabetização. O
domínio do sistema Braille é um facilitador na aprendizagem, e pode acontecer
de forma simultânea o ato de aprender o sistema alfabético e o aprendizado
manual da leitura e da escrita específica para pessoas cegas. Nesse sentido, a
alfabetização é um processo que varia de criança para criança. Por exemplo, se
o aluno vive em um ambiente que estimula a leitura, isso facilita o ensino dos
usos sociais da linguagem, pois, atualmente, o melhor caminho indicado para se
alfabetizar uma criança é por meio dos textos. Com isso, pode-se começar a
alfabetização a partir dos nomes próprios, fazendo os alunos reconhecerem as
letras que formam esses nomes e, por meio da análise linguística, explicar o porquê
de os nomes serem escritos com letras iniciais maiúsculas. O trabalho com o
nome pode partir de uma música, com o texto oral. Nesse sentido, o nome pode
ser um texto, a exemplo da canção intitulada “Todas as coisas têm nome”.
Pode-se também trabalhar a história do nome, detalhando de que forma e por que
aquele nome foi escolhido para a criança. (CUNHA, 2015, p. 48).
Analisando as colocações de
Cunha (2015) podemos constatar que a alfabetização e o ensino de Língua
Portuguesa para os alunos com deficiência visual seguem o mesmo percurso que os
processos de ensino para as crianças videntes. No entanto, a presença do
Braille e o conhecimento deste sistema pelos professores devem ser considerados
fundamentais para que os alunos cegos possam ter acesso ao conteúdo das aulas e
aos bens culturais. Além disso, a pesquisadora apontou a importância do uso de
textos no processo de alfabetização, independente das condições do sujeito.
[...] o caminho mais eficaz para se ensinar a
língua portuguesa na escola é através do texto, pois esse aluno que estava
sendo alfabetizado, por exemplo, já tinha 12 anos de idade, é um falante nativo
e, por isso, convive diariamente com pessoas que também falam esse idioma. O
mais adequado seria que o professor alfabetizador aproveitasse o texto a partir
de assuntos que são familiares ao cotidiano do aluno, pois assim a
alfabetização não teria esse teor mecanicista, com palavras soltas e
descontextualizadas (CUNHA, 2015, p. 90).
Portanto, para que o processo de
alfabetização de qualquer criança dê resultado, é preciso que o professor parta
de algo que faça sentido para ela, e a alfabetização da criança com deficiência
visual não é diferente neste sentido. Desta forma, no processo de alfabetização
de crianças deficientes visuais, o procedimento deve ser o mesmo, porém fazendo
uso dos recursos das tecnologias assistivas necessárias ao apoio deste aluno.
Sobre as aulas de Língua
Portuguesa no Ensino Fundamental II (6º ao 9º ano), Cunha (2015, p. 109)
apontou que
Para haver mudança no ensino de Língua Portuguesa
na escola pública, faz-se necessário que se deem possibilidades e estratégias
de ensino que contemplem as necessidades de todos os alunos. Há a ausência de
suporte de recursos que viabilizem um ensino mais contextualizado. Inúmeros são
os problemas enfrentados por aquela escola pública para que haja a melhoria da
qualidade no aprendizado. Se o professor quiser levar um texto para a sala de
aula, por exemplo, ele mesmo deve arcar com as despesas desse material, porque
a máquina copiadora só é utilizada para imprimir avaliações; ou seja, não há
suporte financeiro para manter aquela máquina funcionando para outros fins
pedagógicos que não sejam as provas.
Com base nestas colocações, nos
convém ressaltar as dificuldades enfrentadas pelos professores em todo o país
em razão da ausência de recursos necessários para o desenvolvimento de seu
trabalho.Muitas vezes faltam os materiais básicos para o atendimento até mesmo
dos alunos videntes. Logo, a ausência dos recursos necessários ao atendimento dos
alunos com deficiência visual é parte da realidade de muitos profissionais da
educação. Em suas considerações finais, Cunha (2015, p. 122) afirmou que
Constatou-se, na pesquisa de campo, que o ensino da
Língua Portuguesa nas turmas analisadas da alfabetização e do 8º ano do ensino
fundamental ocorre de modo desvinculado das práticas sociais da leitura e da
escrita. Além do ensino da Língua Portuguesa de modo estanque e fossilizados,
com os alunos da turma do 8º ano não foram observados o uso de recursos TAs
utilizadas pela professora. Nas matrizes curriculares dos cursos de
licenciatura em Letras/Português e Pedagogia, encontraram-se disciplinas
básicas, conforme exige a lei, que tratam especificamente da educação dos
alunos com deficiência, mas os professores da sala de aula do ensino regular
ainda se dizem despreparados. Também, verificamos que em nenhum momento o
professor de Língua Portuguesa trabalha de modo articulado com as professoras
da sala de recursos multifuncionais. Notou-se uma total dependência do auxílio
que o aluno recebe no Atendimento Educacional Especializado, visto que são
esses professores especialistas que normalmente recebem cursos de atualizações
de conteúdos na área da inclusão.
Conforme nos foi possível
constatar por meio dos estudos de Cunha (2015), as dificuldades encontradas no
trabalho pedagógico com o aluno deficiente visual são muitas e complexas,
incluindo desde a formação dos professores até aspectos básicos da
escolarização, como a falta de recursos e materiais necessários ao processo.De
qualquer forma, a oferta de uma educação de qualidade para os alunos com deficiência
visual exige a implementação de condições para o seu atendimento, pois somente
assim estes alunos poderão ser inseridos nos contextos sociais e escolares de
acordo com seus desejos pessoais e projetos de vida.
CONSIDERAÇÕES
FINAIS
Conforme
foi possível constatar com este estudo, há um número muito baixo de estudos
sobre os processos de ensino e aprendizagem da Língua Portuguesa para
deficientes visuais.
Conforme
já mencionado anteriormente, talvez estes estudos estejam sendo desenvolvidos a
partir da análise de aspectos específicos do processo de ensino e aprendizagem
e não de uma maneira que nos permita compreender o processo como um todo. No
entanto, é importante reiterar que a visão global é fundamental para que
possamos identificar quais as melhorias necessárias à educação escolar dos
alunos com deficiência visual.
De
qualquer forma, os estudos por nós analisados, mesmo em um número muito
pequeno, demonstraram significativas falhas no processo que podem implicar de
forma bastante negativa sobre estes alunos.
As
pesquisas analisadas pontuaram vários problemas, como a falta de formação
inicial e continuada dos professores, o preconceito ainda existente nas
posturas e nas falas destes profissionais, o esquecimento das necessidades do
aluno presente na sala, o desconhecimento acerca do Sistema Braille e das
tecnologias assistivas para o atendimento educacional dos alunos, a ausência de
materiais adequados e adaptados para uso em sala de aula comum e na sala de
recursos, a falta de diálogo entre os professores da sala comum e os
profissionais do Atendimento Educacional Especializado, entre outras.
Frente
a estes aspectos, consideramos que um importante ponto chave para a busca de
soluções está na formação dos professores, pois estes profissionais são
imprescindíveis tanto no processo de formação dos sujeitos por meio da
escolarização, quanto no desenvolvimento da subjetividade e na luta pelos
direitos das pessoas com deficiência.
Além
disso, são estes profissionais que, juntamente com os alunos, legitimam e
validam os recursos e materiais pedagógicos disponíveis, além da possibilidade
de contribuírem para o desenvolvimento de novas tecnologias que venham a
assistir os deficientes visuais durante a sua escolarização e ingresso no mundo
do trabalho.
Portanto, a formação de
professores é parte fundamental para a inclusão escolar e social dos alunos
deficientes visuais, fazendo com que a inclusão social e escolar de todos os
alunos venha a acontecer de fato, garantindo a todos o direito à cidadania e à
uma vida plena.
REFERÊNCIAS
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estudo de diferenças semióticas e didáticas dessa transformação no âmbito do
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arttext&pid=S1413-65382013000100005>. Acesso em
13.03.2018.
[1] Licenciada em Pedagogia
e Especialista nas áreas de Psicopedagogia, Educação Infantil e Gestão
Educacional. Atua na Prefeitura Municipal de São Carlos. E-mail: bruna_camandaroba@yahoo.com.br
[2] Mestre e Doutora em
Educação Especial pela UFSCar. Especialista em Educação Especial pela UNICEP.
Pedagoga pela Faculdades São Luís de Jaboticabal. Docente do Atendimento
Educacional Especializado do IF Baiano Campus Catu. E-mail: patriciaoliveira.eduesp@gmail.com
[3] Para mais informações, consultar página
da GeoCapes.